vixe maria/Moreira Serra é demitido da Cruz Vermelha
Revista Veja
As
denúncias de desvio de dinheiro doado para a Cruz Vermelha derrubaram o
presidente e o vice-presidente da instituição no Brasil. Walmir de
Jesus Moreira Serra, presidente da Cruz Vermelha Brasileira, e Anderson
Choucino, o vice, pediram demissão após uma reunião realizada ao longo
desta terça-feira. O pedido foi, na verdade, uma negociação entre os
representantes do conselho da entidade, que disseram não admitir mais as
“infrações ao estatuto” da entidade, ocorridas na gestão de Serra e
Choucino. Entre as irregularidades estão a falta de prestação de contas e
o não pagamento de uma anuidade devida à Cruz Vermelha Internacional – o
débito, acumulado desde 1994, que já atinge 3,4 milhões de francos
suíços (ou 4 milhões de dólares).
Uma
chapa única, liderada por Nício Brasil Lacorte, que presidia a filial
do Rio Grande do Sul, foi eleita e já assumiu o comando. Começa, então,
outro problema: Lacorte foi indiciado por uma CPI da Câmara Municial de
Balneário Camboriu. Ele figura entre os envolvidos no desvio de recursos
destinados à gestão de um hospital na cidade. A prefeitura de Balneário
Camboriú, em Santa Catarina, cancelou o contrato que previa repasse de
82 milhões de reais para administração do hospital Ruth Cardoso. A
gestão do contrato estava a cargo da filial gaúcha. Do total repassado
pela prefeitura à entidade, cerca de 100 mil reais foram parar nas mãos
do Instituto Interamericano de Desenvolvimento Humano (Humanus), de São
Luís do Maranhão. O Humanus já esteve registrado em nome da mãe do
vice-presidente nacional da Cruz Vermelha, Anderson Marcelo Choucino. O
dinheiro teria sido usado para quitar dívidas com agências de viagens e
repassados à filial maranhense da Cruz Vermelha.
Lacorte
aparece, no relatório da CPI, com papel semelhante ao de Walmir Serra –
também indiciado. Diz o item 5.4 do relatório: “Os Senhores Nicio
Brasil Lacorte e Walmir de Jesus Moreira Serra Júnior, na qualidade de
dirigentes da Cruz Vermelha Rio Grande do Sul, apropriaram-se de verbas
que deveriam ser utilizadas no atendimento hospitalar do Hospital Ruth
Cardoso ao encaminhar mais de R$ 1.500.000,00 (um milhão e quinhentos
mil reais) a duas outras entidades (Cruz Vermelha Nacional e Cruz
Vermelha Nacional do Maranhão), sem previsão e sem justificativa
plausível, incorrendo, assim, nas sanções do art. 312 do Código Penal
Brasileiro; além disso, também deram aplicação diversa à verbas públicas
ao adquirirem produtos e em especial veículo camionete Chevrolet S10,
no valor de R$ 79.092,45 em nome de pessoa estranha ao contrato, sem
qualquer previsão legal, infringindo o art. 315 do Código Penal
Brasileiro; além de terem incorrido nas sanções dos arts. 10º. e 11 da
Lei 8.429/92, por terem praticado atos de improbidade administrativa que
causaram prejuízos ao erário e atentaram contra os princípios da
administração pública, especialmente o da legalidade.”
Nesta
terça-feira, VEJA obteve um ofício que prova que era Walmir Serra quem
determinava o destino do dinheiro. A empresa Mitsui & Co. S.A., que
doou cerca de 150.000 reais para as vítimas da tragédia na serra
fluminense, foi orientada, em um ofício enviado por Serra, a depositar o
dinheiro em uma conta do Banco do Brasil em São Luiz do Maranhão. A
filial maranhense é dirigida pela irmã de Serra, Carmen Serra.
As
irregularidades começaram a ser levantadas pela funcionária Letícia Del
Ciampo, que assumiu o escritório de Petrópolis da entidade. Depois de
encaminhar documentos ao Ministério Público e de dar declarações
públicas sobre as irregularidades, ela recebeu ameaças de morte e pediu
proteção policial.
Na reunião desta
terça-feira, foi confirmado oficialmente o que VEJA noticiou em agosto:
não se conhece o destino do dinheiro arrecadado para ajudar as vítimas
da chuva na região serrana, do terremoto no Japão, e da crise
humanitária na Somália. As três campanhas foram realizadas em 2011, na
gestão de Serra. O rombo, no entanto, deve ser ainda maior do que o
estimado inicialmente. De acordo com Gustavo Ramirez, representante
regional da Federação Internacional da Cruz Vermelha, “há muito tempo” a
Cruz Vermelha Brasileira não presta contas. “Temos solicitado
prestações de contas. Isso não é normal nem bom, porque afeta a imagem
da Cruz Vermelha no Brasil e internacionalmente. Não podemos aceitar
esse tipo de comportamento porque vivemos de nossa credibilidade”,
disse.
O chefe da delegação regional
do Comitê Internacional da Cruz Vermelha, Felipe Donoso, manifestou
preocupação com o abalo à imagem da instituição. “É a primeira vez que
vejo uma situação como essa. A partir do momento em que não temos a
garantia e a possibilidade de prestar contas, nossa entidade está
ameaçada”, disse Donoso.
VEJA
descobriu que a Embaixada da África do Sul destinou 230.000 reais aos
desabrigados da serra fluminense e nunca recebeu um relatório sequer
sobre a utilização do dinheiro. VEJA teve acesso a uma lista de empresas
e bancos que juntos doaram cerca de 1,5 milhão de reais para os
desabrigados fluminenses. A Cruz Vermelha do Japão registra o
recebimento de 164 000 reais para as vítimas do tsunami, mas os recursos
eram provenientes apenas da Cruz Vermelha de São Paulo. O dinheiro
arrecadado pelo escritório nacional foi parar nas contas secretas do
Maranhão, como mostrou a reportagem.
Presidente da Cruz Vermelha destinava doações para conta no Maranhão
Em
uma reunião iniciada na manhã desta terça-feira, na sede da Cruz
Vermelha Brasileira, no centro do Rio, o presidente nacional da
instituição, Walmir de Jesus Moreira Serra, tenta explicar ao Conselho
Diretor Nacional da entidade os desvios de valores recebidos a partir de
doações de empresas e pessoas físicas. Serra será confrontado com pelo
menos uma revelação inconveniente: apesar de já ter afirmado que “não
sabia” ou “não interferia” na destinação de valores para contas na
filial maranhense da Cruz Vermelha, um documento obtido por VEJA mostra
que ele próprio orientava doadores a efetuar depósitos em contas naquele
estado. A irmã de Serra, Carmen Serra, é quem comanda a Cruz Vermelha
no Maranhão, como mostrou reportagem de VEJA.
A
direção nacional da entidade dará entrevista coletiva às 16h para
esclarecer detalhes das acusações de desvios de recursos, feitas a
partir da filial de Petrópolis. A funcionária que denunciou as
irregularidades, Letícia Del Ciampo, recebeu ameaças de morte e pediu
proteção policial, depois de expor as irregularidades nas contas da
instituição.
Walmir Serra vinha
afirmando que a decisão de depositar o dinheiro nas contas no Maranhão
era do tesoureiro e da vice-presidência, isentando-se de culpa. No
entanto, VEJA obteve a cópia de um ofício enviado em 26 de janeiro de
2011 para a Mitsui & Co. S.A. A empresa doou cerca de 150.000 reais
para as vítimas da tragédia na região serrana do Rio, naquele mês. No
ofício, assinado por Walmir Serra, há a orientação sobre os dados para
depósito em nome da entidade. A conta listada, de número 80.000-7, na
agência 1611-X, do Banco do Brasil, fica em São Luiz do Maranhão.
A
direção da empresa pensava doar para as famílias atingidas pela chuva
na serra, que deixaram cerca de mil mortos e centenas de famílias
desabrigadas. O dinheiro, no entanto, nunca chegou. Assim como nunca
foram repassados também valores doados para vítimas do terremoto no
Japão ou para a crise humanitária na Somália.
Nenhum comentário:
Postar um comentário